No Planalto, o Pato é Manco
Por Márcio
Coimbra*
Lame duck ou
pato manco. É assim que a política se refere a um mandatário fraco, sem
poderes, que permanece no cargo. Diante da terceirização do governo, conduzido
por Michel Temer na política e por Joaquim Levy na economia, não há como não
enxergar em Dilma a mais perfeita materialização dessa expressão.
A política está
cheia de patos mancos. Em certa medida, Barack Obama também encarna com
excelência a figura da ave com deficiência. Chegou ao poder com maioria
absoluta no Congresso. Logo depois disso, primeiro perdeu a Câmara e mais
recentemente o Senado, tornando-se um legítimo Presidente sem iniciativa
parlamentar ou força para implementação de qualquer proposta de política
pública. Obama aguarda o fim de seu mandato sentado no Salão Oval, enquanto os
republicanos dão as cartas na outra ponta da avenida Pennsylvania.
Se patos mancos
geralmente surgem em final de mandato, outros podem aparecer antes. É uma ave
rara, mas existe. É uma situação perigosa
para o governante. Collor foi abatido desta forma. No caso brasileiro atual, a
ocorrência do fenômeno surpreendeu pela rapidez. Dilma tornou-se um pato manco apenas
três meses após iniciar seu segundo mandato.
Para evitar o
pior, Dilma chamou os caçadores para protegê-la. Resolveu entregar a
articulação política, trabalho que lhe causa calafrios, para Michel Temer. O
Vice Presidente acalmou os ânimos e tirou o Planalto das cordas. O governo, que
quase faleceu, respira novamente, agora
por aparelhos, mas que operam sob a supervisão de Eduardo Cunha e Renan
Calheiros.
Dilma, que ouviu
Lula ao trazer Michel Temer para o palco, precisa conter seu ímpeto imperial
caso realmente queira evitar o pior. Está muito claro para o triunvirato
Cunha-Renan-Temer que ao menor sinal de vacilo do Planalto, o impeachment pode
ser colocado em pauta e o PMDB pode assumir também de direito a condução de um jogo
que já comanda de fato. Logo, se Dilma acredita que pode causar intrigas entre
os três aliados, é melhor colocar as barbas de molho. Nada é mais prazeroso
para os peemedebistas do que manter um governo fraco acuado, recolher benesses
e indicações e ainda liderar a oposição.
Joaquim Levy é o
outro pilar do governo. Nas suas mãos e medidas residem a possibilidade de
ajuste das contas públicas, que começaram a perder o rumo no segundo mandato de
Lula, mas que descontrolaram-se completamente nas mãos de Dilma, defensora de
uma nova matriz econômica que fracassou. As medidas amargas, que visam resgatar
o modelo bem sucedido do Real, precisam do apoio do PMDB e PT para prosperar
tanto na Câmara, quanto no Senado. Sem isso, Dilma pode tornar-se uma ave
migratória, daquelas que rumam para o sul.
Se Temer é capaz
de articular com PMDB, base governista e até a oposição, caberá a Lula acalmar
os ânimos de seu próprio partido, fazendo com que seus deputados e senadores
votem medidas impopulares que acalmem a economia e os mercados. Seu incentivo é
simples: com a economia e a política estabilizadas, ele deseja asfaltar seu caminho
de retorno ao Planalto – noves fora a Lava Jato e as investigações dos
procuradores federais que já esbarraram em seu nome.
Enquanto os
atores se dividem no palco, seja na articulação, na economia ou na oposição,
vemos que o governo não possui qualquer projeto para os próximos anos. Dilma é
hoje um pato manco em começo de mandato. Alguém que delegou o poder, sob
pressão de Lula, para manter sua coroa e as chances de retorno do chefe. O risco
de impeachment, por hora, está controlado, mas não descartado. Dilma viverá com
esta sombra até a sucessão começar a se desenhar, pois como sabemos, quando
manco, o pato é presa fácil.
*Mestre
em Ciência Política pela Universidad Rey Juan Carlos (Espanha).
Diretor-Executivo
da Coimbra – Assessoria Política (Brasília, DF).
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